Dia do Patrimônio Histórico: a importância de preservar a identidade e a cultura em Schroeder
O patrimônio arquitetônico, além de encantar pela beleza, remete a um período histórico e preserva as origens de uma comunidade. As características desses imóveis representam a cultura e os antepassados de um povo, sua essência. No entanto, existem particularidades e curiosidades que os prédios antigos guardam e que, talvez, não sejam do conhecimento das gerações que sucedem esse patrimônio.
Você por acaso já ouviu a expressão “sem eira nem beira”? Pesquisas revelam que a frase teve origem em Portugal e significa que a pessoa vive miseravelmente. Não possui terra e nem casa. No entanto, essa expressão também pode estar ligada às construções alemãs, como explica a diretora de Cultura de Schroeder, Neiva Lúcia Plantikow.
“Os arcos presentes em algumas casas no estilo enxaimel também podem representar essa expressão. Vários arcos formavam a eira, apenas um arco era beira. Portanto, quem não tinha condições de erguer uma casa, não tinha eira nem beira”, revela.
Curiosidades à parte, o fato é que nesta terça-feira (17), é celebrado o Dia Nacional do Patrimônio Histórico, uma data cuja celebração e a importância estão na promoção e administração do processo de preservação dos bens culturais do país, no fortalecimento da identidade nacional, na garantia do direito à memória e na contribuição para o desenvolvimento socioeconômico do país.
Em Schroeder, algumas leis e decretos visam proteger o patrimônio cultural da cidade: Lei 2.155/2015, que dispõe sobre a preservação do patrimônio natural e cultural de Schroeder e instituiu o fundo de proteção do patrimônio cultural; Decreto 3264/2015, que proíbe as demolições de edificações antigas em todo o território do município de Schroeder; Lei 2.179/2016, que institui o cadastramento de bens culturais de Schroeder.
“Não temos ainda nenhum bem imóvel tombado no município, o que temos são imóveis inventariados e imóveis cadastrados no Livro de Castro de Bens Culturais. Os proprietários de imóveis cadastrados foram cientificados do interesse de proteção do seu imóvel”, comenta Neiva.
Como existe um decreto que proíbe demolições de construções antigas, sempre que houver a intenção, o proprietário deverá protocolar o pedido para a licença junto à prefeitura, este será encaminhado ao CMPC Conselho Municipal de Políticas Culturais para realizar estudo sobre o imóvel e, somente após, emitir o parecer favorável ou não à demolição.
Enxaimel – a história da comunidade alemã contada através da arquitetura
Entre os 36 bens cadastrados estão todas as casas em estilo enxaimel, algumas outras construções autoportantes com memória histórica relevantes para o município, os cemitérios, as igrejas e a Usina do Bracinho.
Com a mesma característica autoportante, mas com marca própria, as casas enxaimel de Schroeder pertencem, em sua maioria, a agricultores. Uma delas, construída em 1935, continua tão sólida e imponente quanto era há 86 anos.
A residência, pertencente a Ademar Peschke, 75 anos, hoje abriga a quinta geração após a construção pelo avô do atual proprietário, Otto Peschke. A conservação do imóvel se deve tanto à qualidade do material utilizado e técnica executada, quanto aos cuidados com que a família o mantém. Hoje, quem auxilia nos cuidados é a companheira, Wilma Biffi, 65 anos.
No fundo do terreno onde hoje a residência está localizada, Otto tinha outra casa e mantinha uma olaria mais à frente, localizada do outro lado da via. Isso, conforme o neto, há aproximadamente 100 anos.
“Um dia, um vendaval derrubou a casa e arrastou tudo. Foi então que ele decidiu fazer algo melhor e construiu essa aqui. Ele era o mestre de obras e serrava uma tábua de canela preta [árvore brasileira que pode chegar a 45 metros de altura] por noite, com machado e serra. Foram anos até conseguir terminar a construção da casa”, revela Ademar.
Enxaimel é uma técnica construtiva em que as paredes são feitas de vigas de madeira posicionadas na vertical, horizontal e diagonal, formando uma espécie de treliça. Os espaços são preenchidos com tijolos, pedras, adobe, entre outros tipos de materiais. O encaixe das peças é feito por pinos.
A técnica milenar foi aperfeiçoada pela arquitetura alemã na Idade Média. No Brasil, o enxaimel está presente principalmente na região sul do país e faz parte da arquitetura de imigração.
Na memória, Ademar busca capítulos da história do avô que demonstram todas as dificuldades vividas na época. “Ele tinha uma vaquinha e fazia manteiga para vender em Jaraguá. Ia a pé para vender a manteiga e comprar fósforo e sal, coisas que ele não produzia aqui. Chegou a um ponto em que o fósforo se tornou muito caro e ele partia o palito para usar mais de uma vez”, revela o neto.
Na residência, a sala principal, hoje transformada em quarto, uma pintura próxima ao teto chama atenção, já que este é único cômodo decorado dessa forma. “Aqui era o salão de dança, por isso é pintado assim”, explica Ademar.
No sótão, é possível notar o capricho e cuidado da família em relação ao imóvel. “Aqui, só o que trocamos nesses anos todos foram as telhas e as tábuas da varanda. O restante continua igual [à construção original]”, ressalta.
O telhado é uma característica marcante da arquitetura enxaimel, por ser bem elevado e com inclinação acentuada – alternativa que os alemães da Idade Média encontraram para lidar com o clima do país. Como umidade e volume de chuva altos durante o ano todo, o telhado com esse formato faz com que a madeira não molhe, evitando que apodreça.
Na casa, também residiu o pai de Ademar, Ottoli que, segundo contou, foi patrulheiro, taxista e o primeiro vereador da cidade, inclusive, conduzia as noivas schroedenses até a igreja.
O entorno da residência dos Peschke mudou bastante nos últimos anos, com o nascimento dos 3 filhos, 6 netos e 2 bisnetos de Ademar. Foram feitas ampliações e a estrutura para os negócios da família, que comercializa peixes e bananas.
Porém, a imponente construção enxaimel mantém o principal legado da família alemã preservado, com as memórias afetivas passando de geração a geração.